Como dona Almerinda não possuía recursos - e convenhamos, seis filhos não permite a ninguém que se repare em detalhes comportamentais – só foi saber da doença do filho tardiamente, quando ele já tinha 16 anos. O marido a abandonara logo após o segundo filho. Os outros vieram com seu Alípio, com quem se amasiou. Isso era um motivo que a fazia se sentir culpada pelo grave problema do filho, mas sem em nenhum momento fazer transparecer.
Voltemos então à visita: era uma casa surpreendentemente arrumada. Quando adentraram à sala, os pais de Ataíde sentiram que estavam sendo aguardados. Os seis filhos de dona Almerinda estavam dispostos no malhado sofá em ordem crescente. Selma, Sonia, Samuel e Claudio – o que tinha Pica - Caio e Caiane do pai fujão. Esse cenário pouco mudou durante toda a visita. Sentaram-se nas cadeiras da cozinha que, quase uma com a sala, separados apenas com uma estante de caixotes pintados onde havia vários porta-retratos. Nas paredes havia alguns quadros sem nenhuma estética, como se fossem colocados onde já tinha o prego. Uma pequena televisão ligada, mas sem volume, apenas para distrair a menorzinha que assistia os desenhos.
Tomaram café, comeram bolo caseiro, conversaram coisas de se jogar fora, mas não sabiam como entrar no assunto. Era inevitável que, ora o pai, ora a mãe de Ataíde, varriam o ambiente a procura de, digamos, marcas da doença. Esses olhares terminavam sempre no sofá abarrotado de filhos, que correspondiam com um risinho encabulado e desconfiado.Caiane foi quem se aproximou da mesa e disparou: “querem ver meu irmão comer um prendedor de roupas?”. A mãe de Ataíde engasgou-se com o bolo. Dona Almerinda correu pegar um copo d’água. O esposo olhou para o sofá e os meninos se divertiam. Ele também sorri sem jeito. A que estava engasgada, recuperada, diz a Caiane: “Não é preciso...”.
quinta-feira, 25 de dezembro de 2008
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