Irada terra arretada ri: além de palíndromo, é o que me ocorre. A terra ri. Quando gargalha então, mexe com o planeta. Terremoto... Parece sádico?
Ri das teorias e explicações que dão às suas manifestações. Ri da inocência do homem que a considera amiga, aliada. A terra já não é – ou jamais foi – tão parceira assim da humanidade. Ri quando lhe fazem cócegas com foguetinhos aqui e ali. Quando lhe depilam as matas. Dá gargalhada com a lipoaspiração que faz jorrar seu sangue negro e depois, perde o fôlego de ver o mórbido tom pastel da mistura com o sangue humano brigando por aquele.
Irada a terra ri das contradições humanas e se pergunta:
Por que o ser humano só se mexe quando eu me mexo?
Mexo-me porque estou me acomodando, enquanto eles só se mexem quando são incomodados.
Reclamam das catástrofes, mas ajudam muito mais as instituições financeiras que seus iguais.
Reclamam dos paredões que esmagam crianças, mas ajudam mais em ligações aos paredões do BBB.
Reclamam do caos que provoco, mas vibram e vendem com as imagens que capturam.
Lastimam os escombros do mercado por cima de gente, mas suas leis de mercado oprimem, sufocam e aprisionam muita gente.
Rezam aos deuses e citam o apocalipse, mas não lutam o cada um por si e Deus por todos, e sim o cada deus por si e nenhum por todos.
Por isso tento ficar quietinho por aqui. Não tento agradar a terra nem a natureza. São inagradáveis. Suas investidas são indiscriminadamente severas. Se o sol nasce para todos, as enchentes também inundam todos, as erosões são por sobre todos, os furacões assopram sobre todos... Só abraçar árvore, rolar na lama, catar latinha na praia, pagar o mico-leão-dourado, não vai nos tornar amiguinhos da natureza. Nem a própria moderna eco-religião nos trará a paz com a deusa. Que ri.
Cem Reais. Cem Reais foi toda minha ajuda aos flagelados do Haiti - diz a religião cristã que não se deve proclamar uma boa ação, mas quando a boa ação parece uma gozação, acho que tudo bem. Talvez nem chegue até lá mesmo. É como se fosse um espermatozoidizinho aleijado e cego tentando chegar ao óvulo.
A hipocrisia e a covardia estão em mim como musgo em pedra de jardim. Vivem do sol e da água que reclamo para mim.
A Terra ri.
E nós choramos, por enquanto.
sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
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5 comentários:
Sem licença, citei-te no meu blogue. É o mínimo que podia fazer para divulgar texto tão bom!
OI R. OSÓRIO...
Mto obrigado.
gde abço.
a precariedade da existência se torna tão eloquente na desgraça dos miseráveis...
Cheguei por indicação do Rubinho, fiquei boquiaberta, como palavras podem ser escolhidas tão bem para dizer algo de forma que, mesmo ja sabido, nos deixa de respiração suspensa.
Parabens
Vou passear mais por aqui, antes de voltar ao Rubinho.
Muito obrigado Dona Sra. Urtigão, por todos os comentários.
gde bj
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